quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Um intelectual a sério

Um intelectual a sério, daqueles com queda para génio, distingue-se em pequenas coisas. Pequenas coisas que fazem dele uma pessoa efectivamente diferente. Por isso é que nunca tive talento para intelectual a sério... O meu comportamento é demasiado normal. Além disso, um intelectual a sério conhece-se desde cedo. Desde aquela altura em que não conhecemos bem as letras e achamos que ser capaz de contar até 1000 é um dos grandes mistérios da humanidade. Mistério tão grande que enchemos o peito de cada vez que dizemos a alguém que já somos capazes. Mas isto é vulgar. Invulgar e distinto era o comportamento da M.. Por isso é que ela é o único génio que eu conheci. E foi das minhas melhores amigas, muitos anos. Uma pessoa genuinamente interessante e intelectual a sério. E isso viu-se logo na escola primária. Desde aquele dia em que chorou quando um colega meu deixou cair uma migalha de pão no desenho dela, até aquele em que eu descobri que enquanto eu lia livrinhos de histórias, ela lia e estudava o dicionário, todas as noites. Uma vez no 8º ano adormeceu em cima de um trabalho em EVT. Jogava andebol e não era raro passar noites acordada a terminar trabalhos. No secundário, ainda que estivéssemos mais distantes e em àreas diferentes (a M. seguiu Ciências), a M. continuou brilhante, média quase de 20.

O sonho da M. sempre foi Jornalismo.
Esteve um ano em Jornalismo. 
Calculou com precisão um 13 no exame nacional de Química para garantir que lhe descia suficientemente a média, dizem. 
Hoje está em Medicina. 
Vontade dos pais, dizem. E deve ter calado uns quantos que quando souberam que ela seguiu jornalismo murmuravam pesarosos "Que desperdício!".



8 comentários:

  1. Não percebo a obsessão das pessoas em acharem que os "génios" têm que seguir medicina. Mas espero que a tua amiga tenha feito a escolha que a faz mais feliz :)

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  2. às vezes penso no quão boas as pessoas que estão em medicina seriam noutras áreas.. gente com grande queda para a matemática e física, que teriam sido brilhantes num laboratório.. gente como a tua amiga, que queria fazer das palavras a sua profissão.. seriam brilhantes. mas a pressão..!

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  3. i., eu penso o quão pouco são essas pessoas vocacionadas para exercer medicina e o que implica por contacto directo com o pior e o melhor do ser humano (é preciso saber dominar emoções e nem sempre números) e acabam por se tornam péssimos médicos.

    Não digo que seja o caso da M. Seguindo jornalismo é claro que o contacto com outros está lá.

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  4. tudo pelo estatuto. não percebo o que leva uma pessoa ir para uma coisa da qual não gosta. ter de trabalhar TODOS OS DIAS naquilo que não se gosto deve ser terrível... nem quero imaginar.

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  5. Conheço vários casos de pessoas que seguiram medicina só porque tinham média suficiente, sem terem necessariamente vocação ou vontade de o fazer. Muitas vezes por pressão dos pais. Espero que a tua amiga goste do curso mas, acima de tudo, que tenha vocação para ser uma boa médica!:) Porque não basta saber diagnosticar, é preciso saber cuidar.

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  6. Realmente a tua amiga era uma verdadeira intelectual...lia dicionários?!
    Também o meu sonho é seguir Jornalismo e fui quase "obrigada" a tirar a licenciatura em Direito, no início fui muito infeliz agora que sei que está mesmo no fim já é mais suportável, mas não vejo o dia de poder tirar mestrado no que realmente quero.
    Admiro a coragem da tua amiga!
    E admiro as tuas palavras, por isso te propus um desafio no meu blogue http://inesinesperado.blogspot.com

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  7. joana, é mesmo. podem ser adultos brilhantes, mas falta-lhes o resto..

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  8. Não percebo porque raio é que os pais tentam sempre entrar na vida dos filhos no que respeita a escolhas de cursos. Ela até podia ter uma óptima média mas isso não significa que ela tenha vocação para ser médica! Se ela gostava de jornalismo então ela devia ter seguido essa área. O pior erro que se comete em toda a vida académica é deixarem que os pais escolham o curso que nós devemos seguir por mais que essa não seja a nossa vontade.

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