terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A carta que eu nunca te escrevi

Isto que vou dizer é do mais estupidamente insensível e cruel que há. Gostava de te dizer que mesmo sabendo que não quero forçar-me a amar-te, às vezes gostava de ser outra pessoa noutro lugar, noutra cabeça e, eventualmente, amar-te. Mereces ser amado. Céus, que digo eu... Neste momento estarias a reproduzir o som de uma faca a espetar contra o teu peito e a condenar a minha falta de filtro, eu sei. E a dizer que eu não tenho noção de como a minha sinceridade fere as pessoas, e, neste caso, provavelmente não sei. Mas não quero amar-te. Não quero porque isto não é uma escolha. O amor não se impõe...

Ou impõe? Uma maré cheia de teorias e contra-teorias assaltam-me a mente. Escolho amar-te, vou mimar-te com tudo o que sei que mereces e vai resultar... O amor é uma coisa que, mais do que tudo, se quer ou não, querendo-se, e encontrando-se outra pessoa que o quer construir, o resto vem depois. Portanto porque não me agarro eu a ti? O tal príncipe que és, mas que não me assenta, há-de moldar-se com o tempo que nem plasticina e fundir-se naquela pessoa potencialmente mais imperfeita mas que, eventualmente, tem a grande peculiaridade de ser a minha pessoa, a tal, a prometida, a que, dizem, está algures à espera de alguém exactamente como eu... Portanto para que é que estou à "espera" da minha pessoa se a posso "formar"; se posso construir uma, se seguindo determinados passos, segundo tu dizes, o resultado é o amor, só não é se eu não quiser... Sei lá. Não sei. Nada. Talvez a formulação mais adequada, mas ainda assim desadequada seja, devia amar-te.

Devia amar-te de todas as vezes em que sinto que contigo teria uma casa gélida para tornar quente nos mais longos e frios Invernos. Devia amar-te porque sei que te deitarias comigo na relva no Verão, sem te cansar de olhar o céu, e que eras capaz de me ficar a ouvir falar horas sem fim. Devia amar-te porque tu me vês como a pessoa capaz de materializar todos os teus sonhos, mas eu acabo apenas a fabricá-los... E sinto-me uma sobremesa instantânea: um pacotinho apresentado ao "dono" e pronto para se tornar em tudo aquilo que ele quer. Mas a culpa não é tua. É minha porque saltei ingredientes.

Orgulho-me mesmo da pessoa que foste e da pessoa que és e no meio disto tudo é estranho que não possas ser pessoa comigo. Mas não podes. Porque mais do que não querer não consigo, porque contigo as coisas são só o que são, as palavras são só letras, os corpos são só corpos... E não é sequer aqui que está o problema. O problema está precisamente em não sentir que tenho o golpe de asa que me faça querer fazer com que isto tudo seja algo mais. Às vezes gostava de ter as melhores palavras para te dizer mas sei que é tal como no título que quase inspirou o título desta carta: as melhores palavras que poderias receber de mim são aquelas que nunca te direi. E por isso, por muito que não goste da ideia de perder pessoas em definitivo na minha vida hoje percebo que não havia opção. Porque para mim palavras serão só letras e para ti palavras são composições de Bach.  E a verdade é que no fundo, no fundo, posso dever-te muita coisa, mas não é amor que te devo. Achar que to devo é uma grande desconsideração: não se ama por pena ou por falta de opção.

14 comentários:

  1. Ai Mary, Mary, o que vai para aí... Mas tens toda a razão, " não se ama por pena ou por falta de opção "
    Segue em frente e não olhes para trás. Bjinho :D

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  2. disseste tudo na última frase. assim como não se ordena o coração para não amar, o contrário também não é possível...

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  3. Ai, Mary Jane.. Fizeste-me chorar. Estou lamechas hoje e pronto.. De facto, não se consegue amar assim. Não é uma opção ou uma escolha..

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  4. gosto tanto destes textos, sinceros, escritos com alma.

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  5. Que texto magnífico. Adorei imenso :)

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  6. Um bom texto a falar de amor ;) Gostei! Bjinhos***

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  7. Amar também é o que escreveste, porque o amor também passa por abrir o coração e dizer que não amamos da forma que esperavam de nós, é libertar o outro para seguir em frente, mas custa. A ambos.

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  8. Há amores e amores. E isso que tu descreveste é sem dúvida amor.

    Não é o amor que faz virar o mundo, que enche a alma, que traz certezas a dúvidas que nem sequer existiam.

    Mas é amor. É a amor a ti mesma por não te enganares numa tentativa de consolo. E a amor à outra pessoa, por não alimentares fantasias construídas a um, para um dia mais tarde desfalecerem como um castelo de cartas ao vento.

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  9. Gaja Maria,
    já está tudo muito organizadinho. Este vómito de palavras agora é só uma coisa mais ordenada :)

    Hermione,
    :)

    Ana 100 Sentidos,
    não é cromo :) É daqueles que precisamente não merece ser "trocado", servir de substituição rápida, mas que merece encontrar alguém à altura dele.

    i.,
    sua terrível! Ao menos tinhas panuellos ao lado (com um "l" ou dois?) para não pingar o pc?

    Carolina,
    comentário com poucas palavras mas muita dimensão!

    Ana Rita Pereira,
    obrigada!

    Jovem,
    ou desamor :)

    S.o.l.,
    quando me escreves coisas destas, independentemente da tua idade, só me ocorre escrever "como tu tens crescido!". Pareces sempre pessoa tão sabedora em matérias do coração.

    Carolina.,
    tão grande que foste nesse comentário!

    Jude,
    isso é bom ou mau?

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  10. É mesmo isso, é impossível forçamo-nos a amar alguém. Acho que tiveste a melhor atitude que se podia ter, sincera e honesta :)

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  11. Buu,
    um abracinho depois desse comentário? :)

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  12. As tuas palavras deixam me sempre sem resposta. Acho que nunca estou à altura de responder a estes textos. Tu tens um jeitão para escrever sobre sentimentos...

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